Errar é parte da natureza humana. Mas quando uma marca global tropeça — especialmente ao entrar em outro país — o custo pode ser alto. Em alguns casos, basta um nome mal interpretado para arranhar anos de reputação. E poucas histórias ilustram esse risco como a do lendário (e controverso) caso do Chevrolet Nova.
A narrativa é conhecida: nos anos 1960, a General Motors teria lançado o Chevrolet Nova em mercados de língua espanhola e enfrentado um obstáculo inusitado. O motivo? Em espanhol, “No va” significaria “não vai” — o que, para um carro, seria quase uma piada pronta. A história virou símbolo de como um detalhe linguístico pode virar armadilha comercial. Mas… será mesmo que isso aconteceu?
A força de um mito
O Chevrolet Nova realmente existiu e foi vendido na América Latina, inclusive no México e na Venezuela. No entanto, não há evidências de que o nome tenha comprometido as vendas nesses mercados. Pelo contrário, análises posteriores indicam desempenho razoável do modelo. A General Motors jamais confirmou qualquer revés comercial ligado ao nome.
Ainda assim, o mito resiste. E isso revela algo importante: mesmo quando não é verdade, uma boa história pode ser mais poderosa do que os fatos. Especialmente no universo do branding.
Quando o nome vira problema
Diferentemente do Nova, a Mitsubishi enfrentou um problema concreto ao lançar seu modelo Pajero em países de língua espanhola. Na Argentina, México e outros mercados, “pajero” é uma gíria vulgar para “masturbador”. Para evitar constrangimentos (e prejuízos), a marca rebatizou o modelo como “Montero” ou “Montana”, dependendo do país. Um erro evitado a tempo — e um exemplo claro de sensibilidade cultural bem aplicada.
Globalizar sem localizar é tropeçar no escuro
O mundo está cada vez mais conectado. Mas isso não significa que as culturas se tornaram iguais. Muito pelo contrário: os consumidores locais estão mais conscientes, mais exigentes e mais atentos aos sinais culturais e simbólicos que as marcas emitem.
Naming, slogans, logotipos e até cores podem carregar significados diferentes dependendo da cultura. Traduzir um termo literalmente pode não resolver — e pode até piorar. É por isso que globalizar exige localizar. Não se trata apenas de idioma, mas de sensibilidade, respeito e inteligência contextual.
O que essas histórias nos ensinam?
O mito do Chevrolet Nova e o caso real do Mitsubishi Pajero nos alertam para um risco invisível, mas recorrente: o tropeço silencioso das marcas que falam sem ouvir, que entram sem observar, que traduzem sem compreender.
A moral da história é simples e poderosa: em branding, o custo de um tropeço cultural pode ser muito mais alto do que se imagina.
DICAS PRÁTICAS — COMO EVITAR ERROS DE BRANDING EM MERCADOS INTERNACIONAIS
1. Pesquise os significados locais
Antes de lançar um nome, slogan ou símbolo, investigue se há significados ocultos, duplos sentidos, gírias ou conotações negativas na língua local.
2. Teste com grupos de foco locais
Traduções automáticas não bastam. Realize focus groups com consumidores reais do mercado-alvo.
3. Adapte, se necessário
Não tenha medo de alterar o nome ou posicionamento da marca para o novo contexto. Como a Mitsubishi fez, isso pode ser sinal de maturidade, não de fraqueza.
4. Considere a sonoridade
Avalie como o nome soa ao ser pronunciado na língua local. Às vezes, o problema não está no significado, mas na forma como é ouvido.
5. Monitore continuamente
Gírias e conotações culturais evoluem. A percepção de marca hoje pode ser diferente amanhã. Mantenha-se atento.
Porque, no fim das contas…
Tropeçar é humano. Mas no Branding, pode custar muito caro.