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Reinaldo Martinazzo

O Paradoxo da Personalização em Massa e o Comportamento do Consumidor.

Quando ouvi pela primeira vez o termo Personalização em Massa, confesso que fiquei intrigado. A princípio, parecia um paradoxo: como é possível combinar a produção em larga escala com a personalização, algo que associamos a produtos feitos sob medida e exclusivos? A ideia de personalizar algo produzido em massa parecia contraditória, mas logo percebi que se tratava de uma evolução estratégica para as empresas fortalecerem o seu posicionamento.

O conceito de Personalização em Massa foi inicialmente introduzido por Stan Davis em 1987. Ele o definiu como a capacidade de alcançar grandes volumes de clientes, típicos dos mercados de massa da economia industrial, enquanto se mantém a atenção individualizada que predominava nos mercados personalizados da era pré-industrial. Posteriormente, B. Joseph Pine II expandiu o conceito em sua obra Mass Customization (1993), descrevendo-o como a capacidade de oferecer uma grande variedade de produtos customizados individualmente, a preços comparáveis aos de bens padronizados.

Nos setores de serviços, esse conceito sempre me pareceu natural e aplicável. Os serviços são geralmente produzidos e consumidos simultaneamente, com o cliente desempenhando o papel de coprodutor. Essa característica permite uma customização mais fluida, mesmo quando há normas e rotinas estabelecidas. Um sorriso sincero, um olhar atento, ou uma resposta personalizada podem transformar a experiência do cliente e agregar valor ao serviço prestado. Se conseguirmos replicar tais atitudes em escala, estamos, de certa forma, massificando a personalização.

Porém, quando falamos de bens de consumo, o desafio de personalizar se torna mais complexo. Produtos físicos normalmente demandam rotinas e processos industriais padronizados, focados em eficiência e custos, o que limita a flexibilidade de adaptação. A questão que surgia para mim era: como personalizar um produto massificado sem perder a vantagem econômica que a produção em larga escala oferece?

Na verdade, a resposta já havia sido dada por Michael E. Porter em 1985 quando publicou Advantage: Creating and Sustaining Superior Performance (em português, Vantagem Competitiva: Criando e Sustentando um Desempenho Superior). Sob a ótica de Porter, mesmo que o produto tenha tido como origem uma linha de produção industrial padronizada, é possível criar diferenciais através do valor agregado, seja na pré-venda, durante o processo de venda, no pós-venda ou até mesmo na customização do design de uma embalagem ou outro item qualquer que seja capaz de ser percebido de forma positiva pelo cliente a ponto de mudar o seu comportamento.

Um exemplo recente e relevante dessa integração entre personalização e tecnologia é a Adobe Experience Cloud. Esta plataforma utiliza um motor de personalização baseado em inteligência artificial e aprendizado de máquina para criar experiências altamente personalizadas em larga escala. Com a análise de dados em tempo real, a Adobe permite que empresas ajustem suas ofertas e conteúdos conforme as preferências individuais dos clientes, oferecendo uma experiência de usuário sob medida sem comprometer a eficiência produtiva. Isso demonstra como a personalização em massa, longe de ser um paradoxo, tornou-se uma estratégia viável e necessária no mercado contemporâneo.

Empresas como Nike e Starbucks também têm explorado com sucesso a personalização em massa. A Nike, com o “Nike By You“, permitiu que os consumidores customizassem cores, materiais e detalhes de seus calçados, enquanto a Starbucks ajustou bebidas de acordo com as preferências individuais dos clientes. A “Clever Little Bag by Puma” é outro exemplo onde a marca se conectou com o público, substituindo a tradicional caixa de calçados por uma combinação de vários componentes: os calçados, a bolsa e partes em papelão, de forma muito inteligente. O saco feito em PET reciclado, que reduziu em 65% o uso de material, não interferiu na reciclagem e dispensou a sacola plástica. Além disso, o saco de PET reciclado passou a ter uma utilidade marginal na sua utilização, conectando ainda mais com o consumidor. Veja aqui.

O relacionamento no ponto de venda também desempenha papel fundamental na agregação de valor. Um produto pode ganhar destaque e preferência no mercado, não apenas por suas características intrínsecas, mas também pela experiência que o acompanha. A forma como o cliente é tratado pode alterar sua percepção sobre o produto, mesmo que ele seja idêntico a outro vendido na concorrência, às vezes até por preço inferior. Esse é o poder da personalização: mudar o comportamento do consumidor ao agregar valor que vá além do produto em si.

A tecnologia tem sido uma aliada poderosa nessa transição. Com o uso de big data, inteligência artificial e automação, as empresas conseguem mapear preferências, identificar padrões e oferecer opções personalizadas em escala, sem comprometer a eficiência produtiva. Isso demonstra como a personalização em massa, longe de ser um paradoxo, tornou-se uma estratégia viável e necessária no mercado contemporâneo.

Em suma, a personalização em massa envolve muito mais do que apenas adaptar produtos; trata-se de entender as necessidades e desejos dos consumidores e criar interações que adicionem valor de forma tangível e perceptível. Seja em bens de consumo ou em serviços, as organizações que conseguem criar essa conexão emocional e prática com seus clientes terão uma vantagem competitiva significativa no mercado.

Daí a importância da visão holística. Enxergar a empresa como um conjunto que seja capaz de transpirar sinergia com o envolvimento de todas as áreas trabalhando em benefício da satisfação plena do cliente, para que a experiência que ele venha a ter com a organização não encontre padrões de comparação. Aqui o encantamento passa a ser a grande meta.

Reinaldo Martinazzo

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