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Reinaldo Martinazzo

Lições do Cavalo de Troia para a Estratégia de Marketing e Competitividade.

Grandes conquistas da história muitas vezes dependeram de estratégias brilhantes e inovadoras. Um exemplo icônico é o estratagema do Cavalo de Troia, que mudou o rumo de uma guerra aparentemente interminável. Mas o que essa história antiga pode nos ensinar sobre estratégias de marketing e competitividade?

Imagine você liderando um cerco que parece impossível transpor. O que faria para virar o jogo? Foi exatamente isso que os gregos enfrentaram diante dos muros intransponíveis de Troia. Lançando mão de um estratagema brilhante, eles conquistaram a vitória. Após dez anos, a guerra chegou a um beco sem saída, a menos que os gregos conseguissem romper definitivamente as muralhas.

O estratagema do Cavalo de Troia, proposto pelo ardiloso Ulisses, foi uma manobra surpreendente onde os gregos fingiram uma retirada, deixando um gigante cavalo de madeira como presente. Os troianos, acreditando que a guerra havia terminado, trouxeram o cavalo para dentro de suas muralhas. O restante da história todo mundo conhece: à noite, soldados gregos escondidos no interior do cavalo abriram os portões da cidade.

Estratagema do Cavalo de Troia e Estratégia de Marketing

Em marketing, um estratagema pode estar associado a uma ação criativa e impactante a ponto de ser capaz de surpreender os concorrentes. Um exemplo notável é a estratégia da Honda no pós-guerra. Sentindo a economia do Japão destroçada, o fundador Soichiro Honda decidiu competir no mercado americano, dominado pela Harley Davidson, que tinha visto a maioria dos concorrentes de toda parte do mundo sucumbir no decorrer das Guerras Mundiais.

Com uma estratégia audaciosa a Honda desenvolveu um novo nicho de mercado, evitando confronto direto com a Harley Davidson, que dominava um segmento associado a uma subcultura de desocupados e desordeiros urbanos, bem retratada no filme “O Selvagem da motocicleta” (1983). Parecia que a Harley Davidson acreditava que o uso de suas motocicletas pela Polícia neutralizava os efeitos negativos dessa imagem junto à sociedade.

A Honda sabia que enfrentaria um desafio monumental para entrar no mercado americano. Contrataram uma agência para a realização de uma pesquisa detalhada sobre as resistências dos consumidores, análise da concorrência, segmentação de mercado, posicionamento e força de marca.

A estratégia de lançamento foi suportada por uma campanha de comunicação diferenciada que falava com um público distinto da tribo que a Harley Davidson havia fidelizado. A Honda comunicava-se com a família e afirmava de forma taxativa: “você vê pessoas de bem andando com veículos de duas rodas”. A campanha focava em economia e liberdade, sem jamais usar a expressão motocicleta.

A primeira motocicleta lançada pela Honda foi a Dream, que, no primeiro ano, tornou-se a moto mais vendida do país, ultrapassando mais de 250 concorrentes internacionais, incluindo 60 japoneses, que competiam no mercado americano. Além dos atributos já citados, o prazer em dirigir e a praticidade de uso provocava o consumidor a fazer um “test drive” do seu produto. Diferentemente da Harley Davidson, com oficinas sujas localizada nos subúrbios, as lojas Honda estavam em pontos nobres da área central, eram limpas, contavam com pessoal qualificado e tinham uma divisão de locação para facilitar a demonstração do produto, provocando assim, para uma experiência memorável.

Com isso, a Honda ganhou competitividade e assumiu a liderança de vendas para nunca mais perder. Monitoravam o mercado como ninguém e, graças à sua cultura de alta competitividade, inovação e a forte disciplina de ajustar suas estratégias conforme a demanda, foram inserindo novas linhas de produtos líderes nos nichos de mercado onde competiam, e na década de 1970, a Honda detinha 60% do mercado americano de motocicletas. Em 1999, o Sr. Honda foi eleito pelos jornalistas do mundo inteiro como “Motociclista do Século”, uma honraria que reflete seu impacto duradouro na indústria de motocicletas.

Na época, a Harley Davidson até tentou lançar produtos para competir no mercado de motocicletas de baixa cilindrada, mas seus produtos se mostraram pesados e ineficientes quando comparados ao concorrente. Isso a obrigou a redefinir o seu posicionamento, revendo os seus produtos enquanto buscava novo espaço no mercado com a adoção de uma estratégia que valorizava sobre todos os aspectos uma proposta de valor só encontrada em marcas como por exemplo Rolex e Ferrari, que foram capazes de conquistar grande prestígio e reconhecimento junto ao público. Não abandonaram a relação com o tradicionalismo e investiram forte em atributos que faziam algum tipo de conexão da marca com um nicho de consumidores que entendiam o produto como se fosse, mal comparando, a extensão do seu próprio corpo.

A Harley Davidson focou num nicho específico e reposicionou a sua marca, buscando inclusive patentear o ronco das suas motos. Com regularidade a Harley Davidson realiza grandes eventos de confraternização, reunindo milhares de motociclistas com o firme propósito de fortalecer a comunidade de clientes fiéis, reforçando a identidade da marca.

Cultura Organizacional: O Alicerce da Estratégia de Longo Prazo

No marketing, a cultura de uma empresa é o elemento mais forte a ser considerado. Ignorá-la pode levar à subjugação no futuro. A cultura organizacional deve ser integrada em todas as estratégias de marketing, garantindo que a identidade da marca permaneça consistente e autêntica.

  • Valorização da Cultura: A cultura de uma empresa molda a percepção dos consumidores e influencia todas as suas ações. A Honda não apenas introduziu novos produtos, mas também uma nova cultura para se deslocar, associando seus veículos a valores positivos e a uma imagem de respeito.
  • Alinhamento Cultural: As estratégias devem estar alinhadas com os valores culturais da empresa. Isso não apenas fortalece a marca, mas também cria uma conexão mais profunda e duradoura com os consumidores.

O que vimos até aqui nos leva a três reflexões básicas:

A primeira, relacionada a Troia, onde o rei Priamo deixou-se enganar pelo embuste e ordenou que o vão dos portões fossem abertos, criando vulnerabilidade, mesmo contrapondo-se as opiniões contrárias; “Não creia nesse cavalo. Seja ele o que for. Temo os gregos, mesmo quando dão presentes” – Eneida, Virgílio, 20 a.C. Mas a observação atenta, a persistência e o uso de um estratagema fizeram toda a diferença para os gregos vencerem uma barreira que parecia intransponível.

A segunda, da Honda, que olhou para o mercado dos Estado Unidos, país que havia acabado de derrotar o Japão na Segunda Guerra, mas isento de paixões enxergou nele um potencial que poderia ser explorado. Focou em um nicho e buscou aprender tudo sobre ele para então fazer sucessivos lançamentos. Essa estratégia de segmentação com lançamento de produtos exclusivos para cada segmento tornou a Honda líder no mercado americano.

A terceira, da Harley Davidson, que como líder de mercado encontrava caminho facilitado pela concorrência que parecia ser pouco eficaz. Ao ver um concorrente desenvolver um novo mercado que eles não tiveram a capacidade de enxergar, entenderam que deveriam salvar a sua marca agregando valor e traçando uma estratégia diferenciada para reposicioná-la.

O que aprendemos com tudo isso?

  • Não tem como dissociar o planejamento de toda a ação. Conhecer o ambiente competitivo e onde residem os nossos pontos fortes e fracos, assim como os da concorrência, antes de medir força no mercado, é de suma importância;
  • O uso de estratagemas certamente nos colocará em vantagem competitiva, uma vez que podemos fazer valer o fator surpresa;
  • Agregar valor ao produto, principalmente com serviços diferenciados nas etapas que os clientes estão migrando dentro do processo de tomada de decisão, favorecem a escolha segura tornando a experiência inesquecível;
  • Desenvolver um novo mercado, embora mais difícil e arriscado, na maioria das vezes é mais eficaz do que simplesmente competir em nichos dominados por concorrentes posicionados. Oferecer para o concorrente o desconhecido, te dará uma vantagem competitiva inicial bastante interessante;
  • Não esqueça do Branding. Construa uma marca forte e confiável, administrando e posicionando-a de forma inteligente a fim de que as vantagens competitivas sejam percebidas pelos clientes;
  • Forme um time vibrante. Qualifique as pessoas e desperte nelas uma sensação de orgulho e de pertencimento. Incentive a determinação e a prática de atitudes positivas;
  • Jamais esqueça que Propósito e Valores são ativos indispensáveis; e
  • Por fim, e não menos importante – “construa o seu próprio cavalo”.

O Equilíbrio entre Astúcia, Estratégia e Cultura

O exemplo do Cavalo de Troia nos lembra que, no marketing, a astúcia e a estratégia devem andar de mãos dadas. Um estratagema bem executado pode abrir novas oportunidades e conquistar o mercado. No entanto, sem uma estratégia sólida e um foco constante na competitividade e na cultura organizacional, até mesmo as táticas mais brilhantes podem falhar.

Os eventos históricos nos mostram que pensar em curto prazo pode levar à derrota definitiva. Os gregos aprenderam com os troianos, os refugiados troianos fundaram Roma e os romanos conquistaram a Grécia, adotando sua cultura. Isso destaca a importância de considerar a cultura no desenho das estratégias.

Para alcançar sucesso duradouro, as empresas devem combinar astúcia com planejamento estratégico, apoiado a uma cultura organizacional robusta. Assim como os gregos usaram um cavalo de madeira para conquistar Troia, sua empresa pode usar a criatividade e a inovação para superar desafios e dominar o mercado.

E aí fica a pergunta: que lições você pode aplicar da história do Cavalo de Troia em sua estratégia de marketing?

Reinaldo Martinazzo

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